A festa mais esperada do ano para os
nordestinos é agora. Sou Campinense e com tal adoro essa época que une as
tradições de nossa terra com nossa herança europeia. É um período de alegria,
comemorações, comidas típicas, danças tradicionais e de nossa música
maior, o FORRÓ.
Este ano não pude viajar para o São João de Campina Grande e
em vez de sentir aquele misto de saudade e nostalgia, me senti aliviada. Digo
isso porque seria muito difícil pra mim ir ao Parque do Povo e não ver Biliu de
Campina, Antonio Barros e Ceceu, Zé Ramalho, Flávio José, Trio Nordestino, Alcimar
Monteiro, Sirano e Sirino, Tom Oliveira, Santana, Os três do Nordeste, a
palhoça de forró pé-de-serra, as barracas de bebidas e comidas típicas, onde
nossa cultura é brindada e apreciada sem restrições nem imposições.
Dói saber que uma festa que nasceu nas comemorações familiares
de bairros e que se tornou numa apoteose de repercussão internacional está
sendo tomada apenas como indústria cultural de massa. Estão simplesmente
aproveitando a importância de uma festividade para o lucro e descaracterizando
aquilo que é nosso. Conversei com minha irmã, que mora em Campina, e ela me contou
da indignação da população em relação a programação do evento, a imposição as
barracas que tiveram limitação de marcas de bebidas, local de compra de
mercadorias e limitação até de menus nos restaurantes da festa. E se não
bastasse até os casamentos celebrados no evento não tinham mais autorização
para fotografias.
Digo isso porque o São João de Campina é celebrado há vários
anos no Parque do Povo e como o próprio nome diz é um espaço de festividade do
POVO, por isso a festa sempre foi gratuita. Mas este ano a proposta era
diferente, a ideia era trazer músicos que estão na mídia nacional, aumentar a
área vip e fazer do evento do POVO uma festa privada, seletiva e extremamente
lucrativa. E isso só não aconteceu porque alguns vereadores e pessoas
influentes de Campina não permitiram.
Quando Elba Ramalho, que canta no nosso São João, chama a atenção para uma descaracterização da nossa
festa ela é vista pela mídia do sudeste como uma pessoa enciumada e que
está querendo levantar muros entre estilos musicais, mas o que a mídia não fez
foi ir a fundo para entender o por quê de Elba questionar a presença maciça dos
sertanejos no São João de Campina. Elba é uma cantora consagrada e não precisa
de intrigas para aparecer na mídia, o que Elba fez foi atentar para o risco que
a tradição do São João está sofrendo com esse desequilíbrio na programação do
evento.
Os sertanejos já participam das festividades juninas há
muitos anos, mas de uma forma limitada até porque o São João é a oportunidade para
os músicos da região exporem seus trabalhos com igualdade. É a hora de Dejinha de Monteiro
subir no mesmo palco de Zé Ramalho e mostrar seu talento. É a hora da nova
geração ver uma apresentação de Biliu de Campina e entrar em contato com uma
cultura muito rica que foi nacionalmente apresentada ao Brasil por Jackson do
Pandeiro. É a hora dos novos forrozeiros mostrarem seu valor e isso não impede
que haja um diálogo com outros estilos musicais. Mas o que não dá é para
aceitar é um São João onde 50% das atrações não são forró tradição. Fazer isso é
suplantar a historia de um povo.
A discussão não é se Marília Mendonça é uma cantora talentosa
porque talento não se discute se reconhece e ela merece o espaço que vem
conquistando, mas quando Elba se refere
a festa de Peão de Barretos, que valoriza a música sertaneja com todo direito e
propriedade, ela está dizendo que assim como eles nós, campinenses, devemos
valorizar e enfatizar a nossa identidade, não por um bairrismo tolo, mas para preservação de uma cultura para as
novas gerações.
A revolta de Alcimar Monteiro é apenas o reflexo da tristeza
dos Trios de Forró-Pé-De-Serra da região, que tem no São João de Campina e de
regiões circunvizinhas a oportunidade de trabalhar. Diferentemente da maioria
das discussões sobre a polêmica essa é uma questão muito além dos estilos
musicais, trata-se de uma questão política, social, cultural e econômica que
deveria ser debatida de forma ampla por se tratar da banalização de uma festa
local tradicional e não da segregação de estilos musicais.
Mas se depois de tudo que foi exposto existir alguma dúvida
então convido a você leitor que imagine a Festa do Boi de Parentins sem as
bandas locais, sem Fafá de Belém, ou quem sabe o Carnaval Carioca sem as bandas
de marchinha e cheio de trios elétricos tocando sertanejo, ou sofrência. O que
mais me dói em toda essa incoerência cultural é saber que o parque do Povo
seguirá lotado porque assim como a cegueira política e moral que vivemos também
estamos vivenciando um processo de “catarata” cultural.
Assim sendo, só me resta deixar meus cumprimentos e orações a
todos os tocares de sanfona, trios de forró, cantores locais, cantadores de
coco, repentistas e a todos os forrozeiros do meu nordeste a minha súplica para que a nossa herança
cultural não seja banalizada e para que as futuras gerações possam sentir o coração
pulsar ,com imenso fervor, ao ouvir a abertura do São João de Campina quando um
cantor local começar a declamar “Olha pro céu meu amor. Vê como ele está lindo.
Olha pra aquele balão multicor como no céu vai subindo...”
Por L. Gonçalo.
OBS: A todos aqueles que não concordam com minha posição
deixo o meu respeito ao seu direito de discordar assim como asseguro meu
direito de me posicionar contra ou a favor da questão.